Meritocracia à Aécio
Meritocracia.
Uma das palavras mais pronunciadas por Aécio nesta campanha é esta, meritocracia.
Faz parte, se entendo, de um esforço de se colocar como um grande
gerente. No jargão corporativo, meritocracia é uma palavra muito
empregada, bem como outra do repertório de Aécio: previsibilidade.
Como todos sabemos, meritocracia é escolher alguém pelos seus méritos, e apenas por eles.
Num mundo menos imperfeito, a mídia teria tratado de verificar a
trajetória de Aécio para ver como, no caso pessoal dele, se manifestou a
meritocracia.
Convenhamos: ele é um forte candidato à presidência, e informações
sobre sua carreira profissional têm, mais que nunca, um torrencial
interesse público.
Mas este mundo é muito imperfeito – e a mídia mais ainda.
A inépcia de jornais e revistas não impediu, no entanto, que
viralizassem na internet documentos que mostram a rápida ascensão de
Aécio.
Examinemos o papel da meritocracia em sua jornada, iniciada cedo. As
informações estão no site da Câmara dos Deputados. Nenhum repórter teria
que suar, portanto, para prestar um serviço relevante aos eleitores.
(Aqui, o link.)
Aos 17 anos, Aécio foi nomeado secretário de gabinete parlamentar na
Câmara dos Deputados. Seu pai, Aécio Cunha, era deputado federal pela
Arena.
Segundo o site da Câmara, Aécio permaneceu nesta posição até os 21 anos.
Há, aí, um fato intrigante: conforme perfil feito pela insuspeita
revista Época, Aécio fazia faculdade no Rio no mesmo período em que era
secretário de gabinete.
Algum jornalista se interessou em esclarecer essa suposta ubiquidade meritocrática?
Mundo imperfeito, mundo imperfeito.
Aos 23 anos, de volta a Minas depois da estada no Rio, foi nomeado
assessor pelo avô, o governador Tancredo Neves. Como avós sempre
encontram méritos nos netos, Aécio poderia hoje dizer que ganhou o cargo
graças à meritocracia.
Tancredo morreria em 1985, pouco antes de tomar posse como primeiro
presidente civil depois da ditadura militar. (Ele vencera, ao lado do
vice Sarney, eleições indiretas.)
Com Sarney na presidência, Aécio deu um salto. Aos 25 anos, era diretor da Caixa Econômica Federal.
O que o candidato Aécio diria, hoje, de um neto de político indicado para uma diretoria da Caixa aos 25?
Aparelhamento?
Como os jornais, que jamais trataram disso, falariam do caso se fosse um neto de Lula?
No Brasil, aparelhamento é quando os adversários fazem nomeações.
Quando você mesmo faz, é meritocracia. FHC nomeou seu genro
diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo, e o desnomeou depois do
divórcio.
Serra deu emprego a Soninha e família na máquina estadual do PSDB.
Mas nada disso é aparelhamento.
A irmã de Aécio ocupa alto cargo público em Minas. O marido dela é peça-chave na campanha de Aécio. Um primo também. Cheque aqui, se tiver dúvida.
Tudo é meritocracia, naturalmente.
Graças à meritocracia à Aécio, Minas sob seu governo ficou em 22.o
lugar entre os 27 estados brasileiros em crescimento econômico entre
2002 e 2010, segundo o IBGE.
O silêncio da mídia permite bravatas meritocráticas a Aécio. E não só
meritocráticas: ele se sente protegido o suficiente para falar em
“decência” mesmo depois de construir, com dinheiro público, um aeroporto
numa fazenda da família.
Este silêncio é obsequioso, mas não gratuito. Caso Aécio se eleja, as
grandes empresas de mídia podem se preparar para as copiosas
quantidades de dinheiro público que choverão nelas em anúncios
governamentais.
E em resposta à chuva de publicidade, o Brasil subitamente melhorará
nas análises de Jabor, Merval, Míriam Leitão. A corrupção desaparecerá
dos telejornais, dos jornais, das revistas. Se nem a compra da reeleição
de FHC foi notícia, o que haverá de ser?
Como disse um genial economista conservador, “não existe almoço grátis”.