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segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Quando a causa não é boa...

Helena Sthephanowitz publica no seu "Blog da Helena" uma boa análise sobre essa loucura do #nãovaitercopa...

Quando a causa não é boa, manifestações não pegam

Apostar todas as fichas na Copa como alvo de protestos parece mais do interesse de quem quer transformar manifestações em exibicionismo, sem maiores consequências, do que lutar por conquistas de fato

por Helena Sthephanowitz

Vanessa Nicolav/RBA

A essa altura, pedir que não se realize a Copa não soa sensato, embora seja correto criticar
Não sei de quem foi a má ideia de fazer manifestações com o mote "Não vai ter Copa", acreditando que haveria adesão popular. É claro que qualquer um tem o direito de criticar e de manifestar pacificamente contra o que bem entender, mas é muito delírio achar que o povo brasileiro embarcaria nessa às vésperas da Copa 2014.
Por mais que haja críticas pontuais, alguns questionamentos e problemas localizados, depois de todo o planejamento e dos estádios prontos, ser contra a Copa agora é como querer deixar uma grande obra inacabada, mesmo estando 99% pronta. Ninguém fica contra, se usar o bom senso. Afinal, o que o povo brasileiro ganharia com um boicote à Copa agora? Nada. Pelo contrário, perderia tudo, sem ter retorno nenhum. Se fosse para ser contra a Copa deveriam ter pensado nisso lá atrás, antes de construir ou reformar estádios. Agora é tarde.
Isso já é o suficiente para explicar a baixa adesão às manifestações anti-Copa de sábado (25). No Rio, reuniram-se cerca de 200 pessoas. Nas outras cidades, menos de cem. Em São Paulo é que houve adesão maior, mesmo assim, os mais empolgados falam em 1.500 pessoas, sendo que a manifestação acabou mal, em confronto, depredação e incêndio.
Um serralheiro perdeu seu Fusca, queimado, ao ficar com um colchão em chamas preso sob o carro. Felizmente, uma criança e duas mulheres que estavam no carro foram retiradas a tempo, ilesas. Os manifestantes alegam que faziam uma barricada para fechar o trânsito, e o serralheiro foi responsável pelo ocorrido ao forçar passagem. Ele alega que passava seguindo o fluxo atrás de dois carros que passaram por ali, ao lado da barricada. É razoável pensar que os black blocs não escolheram propositalmente um Fusca 1975, com mulheres e criança dentro, como símbolo do capitalismo para tocar fogo. Mas se o incêndio no Fusca não foi doloso (premeditado), não deixa de ser culposo (sabia-se do risco que expunha ao incendiar colchão em vias públicas próximo a carros de populares que ainda estavam passando por ali).
Além disso, a própria escolha de apostar todas as fichas na Copa como alvo de protestos parece mais do interesse de quem quer transformar manifestações em exibicionismo, sem maiores consequências, do que lutar por conquistas de fato. Por que não fazer política o ano inteiro para melhorar a saúde, educação, reforma política, e relaxar um pouco na Copa, época em que todo brasileiro extravasa seu lado torcedor? Ainda mais sabendo que há uma eleição neste ano, época propícia a discutir os temas em questionamento.
Outra coisa é que para cada um que não consegue ver a Copa como investimento para gerar empregos e receitas para equipar hospitais e escolas públicas, há milhares de outros que veem. E muitas pessoas, mais do que ver, aproveitam oportunidades para melhorar sua renda, desde o pipoqueiro ao hotel de cinco estrelas.
O Sebrae mapeou 448 oportunidades de negócio que o evento criará para as micro e pequenas empresas brasileiras e colocou na internet. Além do turismo, abrange oportunidades no comércio, moda, artesanato, shows, arte, gastronomia, construção civil, madeira e móveis, agronegócio e tecnologia da informação. A página já teve milhares de acessos, indicando que muitos microempreendedores colocaram em prática as oportunidades de negócios.
Milhares de trabalhadores se qualificaram no Programa Nacional de acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) em cursos relacionados ao turismo, inclusive de idiomas. Há 109 novos hotéis em construção nas cidades-sede, isso sem falar nos meios de hospedagem alternativos, onde até famílias podem cadastrar suas casas para hospedar visitantes.
Por falar em hospedagem alternativa, no Rio de Janeiro, dois microempreendedores individuais criaram o Hostel Favela Inn, no morro Chapéu Mangueira (Rio de Janeiro), que hospeda estrangeiros interessados em conhecer um Rio diferente do circuito turístico tradicional. O morro também já tem um polo gastronômico. Em outras comunidades também existem estabelecimentos semelhantes.
Em Fortaleza, durante a Copa das Confederações, o Banco Palmas, de economia solidária, criado na comunidade de baixa renda do Conjunto Palmares, instalou um quiosque no aeroporto. Turistas, brasileiros e estrangeiros fizeram o câmbio de suas moedas pela moeda social Palmas. O objetivo foi incentivar o turismo comunitário na periferia de Fortaleza e compras na feira solidária do bairro. Alcançou pleno êxito, com 140 empreendimentos e 8 mil visitantes na Feira Solidária. Imagine na Copa 2014.
Todo esse pessoal batalhador que se preparou e investiu para melhorar de vida com a Copa sente-se como o serralheiro ao perder seu Fusca quando vê pessoas gritando "Não vai ter Copa" de forma inconsequente. Isto também explica o esvaziamento dos protestos. Afinal, quando a causa não é boa, as manifestações não pegam.