O jornal Correio do Povo é o mais antigo do Rio Grande do Sul e seu colunista Juremir Machado da Silva é um vento arejado que vem dos pampas...
Porto Alegre, 27 de Janeiro de 2014
Explicando a Direita Miami
O mais comum é que cada personagem não tenha consciência da
sua personalidade. O Brasil vem sendo dominado, na classe média e na
mídia, por um tipo muito especial, o lacerdinha, representante da
direita Miami.
É um pessoal que se acha sem ideologia, pois, para o lacerdinha
autêntico, ideologia é coisa de esquerdista comedor de criancinha. A
direita Miami acredita que todo esquerdista é comunista de carteirinha e
que sonha com uma sociedade no modelo da Coreia da Norte.
O ideal da direita Miami é comer hambúrguer na Flórida, visitar a
Disney todos os anos, ler a Veja, ver BBB, copiar e colar artigos de
colunistas que falam todo dia da ameaça vermelha – e não é o
Internacional nem o América do Rio -, esbaldar-se em shoppings sem
rolezinhos, salvo de patricinhas e mauricinhos, e denunciar programas
governamentais, exceto de isenções de impostos para ricos, como esmolas
perigosas e inúteis.
A direita Miami tem uma maneira curiosa de raciocinar.
– Se você é esquerdista, por que vai à Europa?
– Não entendi a relação – balbucia o ingênuo.
– Se você é esquerdista, por que tem plano de saúde?
A direita Miami contabiliza as mortes produzidas pelo comunismo, no
que tem razão, mas jamais pensa nas mortes produzidas pelo capitalismo
no passado e no presente. Mortes por fome, falta de condições sanitárias
e doenças evitáveis não impressionam os lacerdinhas. Não parece
possível à direita Miami que se possa recusar o comunismo e o
capitalismo brasileiro.
A social-democracia escandinava, por exemplo,
não chama atenção dos sacoleiros de Miami. É uma turma que quer muito
Estado para si e pouco para os outros. De preferência, muito Estado para
impedir greves, estimular isenções fiscais para grandes empresas e
reprimir movimentos sociais.
O mais curioso na direita Miami é que, embora defenda o Estado mínimo
na economia, salvo se for a seu favor, gosta de Estado robusto em
questões morais como consumo de drogas e de sexualidade, aquelas que,
mesmo criticando, costuma praticar e exigir tratamento diferenciado
quando o Estado flagra algum dos dela em conflito com a lei. A direita
Miami fala ao celular, dirigindo, sobre a sensação de impunidade no
Brasil e, se multada, denuncia imediatamente a indústria da multa.
A direita Miami é contra cotas, Bolsa-Família, ProUni e todos esses
programas que chama de assistencialistas e eleitoreiros. Vive de olho no
impostômetro e, para não colaborar com a excessiva arrecadação dos
governos, faz o que pode para sonegar o que deve ao fisco. Roubar do
Estado que gasta mal parece-lhe um dever moral superior.
Um imperativo categórico.
A direita Miami vive denunciando Che Guevara, mas nunca fala de
Pinochet. Se dá uma melhorada na economia dos camarotes, pode torturar e
matar. As vítimas são esquerdistas mesmo. A direita Miami adora metrô
em Paris, quando vai até lá, apesar de achar que tem muito museu chato e
pouco shopping bacana, mas é contra estação de metrô no seu bairro. Tem
medo que atraia “marginais”.
A última moda da direita Miami é o
sertanejo universitário. Quanto mais a tecnologia evolui, mas a direita
Miami se torna primária. O que lhe falta, resolve com silicone.