Na análise, o autor menciona a semelhança entre os chamados Black Blocs - a turba de baderneiros sem noção que tomou conta das legítimas manifestações populares desde junho - e os outros que surgiram entre os "sonháticos" da ex-quase-freira, agora missionária evangélica seringalista, que quer por que quer ser presidente do Brasil mais primitivo.
É boa leitura para esta sexta feira...
Os black blocs sem máscara
Wanderley Guilherme dos Santos
Lei da Selva une black blocs e neoliberais
Um leitor bem humorado de Paulo Henrique Amorim, do Conversa
Afiada, sugeriu a aproximação entre os blackbocs mascarados que
atormentam a cidade e os economistas da pré candidata Marina Silva.
Estes seriam, pela ideologia, blackblocs sem máscara. O exagero normal
de piadas não deixa de ter fundamento, neste caso, na convergência real
entre ideais confessos de uns e ações delinquentes de outros.
Mascarados e sem máscara, ou desmascarados, são contra tudo que
está aí. Sendo o país altamente complexo em sua produção material, vida
associativa e política, “tudo que está aí” é muita coisa para ser
conhecida e avaliada no atacado. A menos, deve ser reconhecido, que os
juízes estejam possuídos por estereótipos bebidos em fundamentalismos
religiosos ou ideológicos. Embora rezando por bíblias diferentes, não há
dúvida que blackblocs mascarados e sem máscara confraternizam no credo
essencial.
Pelo passado de uns, os desmascarados, e presente de outros, os
blackblocs mascarados, todos têm por objetivo o desmanche do patrimônio
público, seja por destruição material direta, seja por supressão legal
ou, ainda, por alienação a terceiros. A variação e bom gosto no modo de
vestir dos sem máscara, em contraste com o militarizado uniforme negro
dos mascarados, não disfarça a hostilidade à propriedade pública que
compartilham. Com ou sem máscara são todos destrutivos blackblocs.
A mídia tradicional e as redes sociais funcionam como atraentes
espelhos das manifestações de violência verbal, escrita ou de
comportamento. Exibicionistas, anunciam onde vão agir pela força de paus
e pedras ou pela compulsão das leis que pretendem elaborar. Discrição e
modéstia não fazem parte do cardápio de moral e cívica desses
autoritários em disponibilidade.
Entre as convergências avulta a doentia incapacidade de organizar
algo construtivo. São parasitas dos movimentos sociais. Não se conhece
uma instituição de defesa de coletividades que tenham criado. Mas estão
sempre presentes no aproveitamento das atividades e organizações de
construtores sociais, sugando-lhes a fama, a energia ou os propósitos.
Foi o que fizeram em tempos idos, os sem máscara, com as empresas
estatais criadas com os recursos e sacrifício da população. E voltariam a
fazê-lo se lhes fosse concedida outra oportunidade. Não facilitaram a
emergência de ações coletivas, empreitada sempre difícil e não raro
cheia de perigos. Mas os mascarados se aproveitam das naturais e
legítimas mobilizações dos setores mais carentes para sugá-los e macular
os propósitos de suas paradas e manifestações.
Desprezam as instituições de representação popular (sindicais,
políticas, pacificamente reivindicatórias) a elas dirigindo permanente
crítica difamatória e humilhante, no que são coadjuvados pela imprensa
blackbloc, muito mais do que marrom. Pontificam nas colunas
jornalísticas os acometidos de dandismo intelectual, cheios de si pela
ausência de contraditório que lhes devolveria a altura própria. Esnobes,
só conversam entre si e acham lindas, exemplos de “democratização da
democracia” (redundância charlatanesca), as tentativas selvagens de
invasão de assembléias legislativas.
Finalmente, o anarquismo cruzado em benefício próprio. Face às
tensões entre interesses populares e mercado, são radicalmente contra a
regulação do Estado nos conflitos da sociedade (blackblocs mascarados) e
no funcionamento a mãos livres do mercado (blackblocs desmascarados).
Há muito mais parentesco entre os blackblocs mascarados e os sem
máscara do que é capaz de imaginar o inocente bom humor de observadores.
Daria uma narrativa interessante fantasiar o que aconteceria em uma
comunidade submetida à ideologia e à ação desses primos em barbárie. Os
dois grupos, enjaulados, provariam da própria medicina.