O Blog "O Cafezinho" de Miguel do Rosário é fonte perfeita de análises sobre a atual conjuntura nacional. Hoje ele publica um texto que deve ficar para a história e no qual põe a nu toda a encenação em torno do julgamento da Ação Penal 470, o mal falado "Mensalão". É primoroso e fica para o registro do futuro:
Do O Cafezinho
Por Miguel do Rosário
Os golpistas e suas marionetes togadas fingiram ignorar nossas advertências sobre os erros grotescos da Ação Penal 470.
Quando não puderam mais abafar nossa voz, passaram a nos ridicularizar e agredir. O Globo publicou vários editoriais duramente ofensivos à blogosfera.
Ao
invés de investigar corporações bilionárias que se consolidaram
recebendo ajuda ilegal de governos estrangeiros, apoiando golpes de
estado, e praticando uma vergonhosa sonegação de impostos, o líder do
PSDB no Senado, Aloysio Nunes, também preferiu nos agredir.
Há uma frase de Gandhi que venho guardando há tempos para citar em momento oportuno. É chegada a hora.
“Primeiro eles te ignoram, depois caçoam de ti, depois tentam te sabotar. E então você ganha”.
O
histórico voto de Celso de Mello em favor de um recurso consagrado há
séculos na tradição jurídica brasileira não apenas evitou um
inconcebível retrocesso dos direitos e liberdades civis; foi sobretudo
uma vitória da razão sobre a barbárie.
Uma vitória da democracia contra o golpe.
O Brasil não saiu às ruas no dia 7 de setembro para pedir “prisão dos mensaleiros”.
O Brasil não saiu às ruas nesta quarta-feira para pressionar o STF a negar um último recurso aos réus da Ação Penal 470.
O Brasil tem saído às ruas, aí sim, para acusar a Globo de ter apoiado a ditadura.
O
Brasil tem saído às ruas para dizer, em alto e bom som, que o maior
mensalão de todos é aquele praticado diariamente pela Globo.
E não adianta agora pedir desculpas.
Embargos infringentes valem apenas para quem acredita na democracia.
Não há embargos infringentes para quem apoia golpes de Estado, e se locupleta com eles.
Os brasileiros querem o fim da impunidade, mas não são tão bobos como a mídia achou que fossem.
Queremos o fim da impunidade, mas não a troco de reduzir os direitos civis.
Queremos o fim da impunidade, mas não validando um processo viciado, repleto de erros e injustiças.
O
fato de Celso de Mello ser um homem de ideias conservadoras deixou
claro que a nossa mídia está abaixo do conservadorismo. Ela é a
barbárie, a ditadura, o golpe.
Aristóteles ensina que a virtude da justiça consiste na moderação, regulada pela sabedoria.
Nossa mídia não tem moderação, nem sabedoria, nem virtude, nem justiça.
Ela
vive de jogar o Brasil contra si mesmo, de incitar o ódio ideológico
contra as forças do trabalho, de criminalizar a política e santificar o
mercado.
Nesta
quarta-feira, essa mídia infecta, delinquente, sonegadora de impostos e
informações, sofreu um duro revés. E a sua representante mais poderosa
e boçal, a Globo, não conseguiu esconder seu desespero e decepção.
Do
alto de sua ridícula soberba, a Globo achou que Celso de Mello poderia
“evoluir”, ou seja, vender uma tradição jurídica de séculos em prol de
uma vendeta política.
Por
um breve momento podemos sonhar com uma Justiça que, ao invés de
perseguir heróis da resistência democrática, irá botar na cadeia os
grandes sonegadores, a começar pelos proprietários da Globo Overseas
Investments BV.
Por
um breve momento podemos sonhar que a impunidade no país será combatida
não através da prisão de inocentes, como Genoíno, Pizzolato,
publicitários e secretárias, mas pela condenação de figuras contra as
quais existem provas concretas de corrupção, como Demóstenes Torres,
Carlos Cachoeira, Arruda e Marconi Perillo.
A
mídia sabe que o Brasil clama por justiça, e por isso mesmo é tão
grande a infâmia de manipular a justa indignação dos brasileiros e
afastar a Justiça dos verdadeiros criminosos.
O que foi o mensalão senão uma cortina de fumaça a esconder os verdadeiros escândalos nacionais?
O mensalão foi um caso chinfrim de caixa 2, um esforço de Delúbio Soares para pagar dívidas de campanha do PT.
Enquanto isso, o PSDB roubava bilhões em licitações fraudulentas do metrô de São Paulo e pontificava no alto de todas as listas dos partidos mais corruptos no país.
Enquanto isso, o DEM praticava a mais descarada corrupção no governo do Distrito Federal.
Enquanto
isso, a Globo patrocinava, como patrocina até hoje, um abominável pacto
de silêncio sobre a sua bilionária sonegação de impostos.
Enquanto
isso, a Veja compunha, com Demóstenes Torres e Carlos Cachoeira, uma
quadrilha criminosa para espionar ilegalmente adversários políticos e
praticar um eficientíssimo tráfico de influência.
Após a decisão, a repórter da Globonews foi entrevistar dois parlamentares.
De
um lado, Nazareno Fonteles, deputado federal (PT-PI), lembrou que a
justiça não pode ser servil à opinião publicada e a setores reacionários
da imprensa. Lembrou que a decisão de Celso de Mello não representa
nenhuma impunidade. Os supostos crimes serão julgados conforme a lei.
Do
outro lado, estava Ronaldo Caiado, também deputado (DEM-GO), com um
discurso profundamente demagógico, falando em tiro na esperança do povo.
Quem é Ronaldo Caiado para falar em esperança?
Quem é Ronaldo Caiado para falar em povo?
Quem é Ronaldo Caiado para falar em justiça?
Caiado simboliza o novo udenismo dos velhos hipócritas.
Em 1954, tivemos que dar um tiro em nosso próprio coração para evitar um golpe.
De 1964 a 1984, tivemos que enfrentar a tortura, o exílio e o insuportável arbítrio.
Em setembro de 2013, fomos salvos pela integridade de alguns juízes.
O
desespero da mídia é porque ela pensava o seguinte: “hum, estamos
perdendo uma eleição atrás da outra; esses petistas ganharam até a
cidade de São Paulo; o mensalão será nossa vingança”.
Investiram milhões e milhões numa campanha de oito anos.
O voto de Mello teve para eles, portanto, o significado de uma amarga derrota.
Aloysio Nunes, líder do PSDB, declarou que está “decepcionado com Celso de Mello”.
Os
colunistas estão de luto. Merval Pereira e Sardenberg planejavam, com
sarcasmo e arrogância, beber um vinho caro em comemoração à tragédia de
um líder da esquerda democrática. Terão que esperar muitos meses e agora
temem beber um vinho azedo.
A democracia brasileira, todavia, amanheceu mais forte, mais severa, mais jovem e mais bonita.
Celso de Mello nos ensinou, a todos, que um juiz, antes de ler os jornais, deve ler a Constituição.
Agora falta os ministros do STF examinarem o laudo 2828 e o regulamento da Visanet,
documentos que Joaquim Barbosa escondeu de outros ministros, que
inocentam Henrique Pizzolato e desmontam toda a tese de acusação.
Informem-se melhor sobre o bônus de volume pago pelas empresas de mídia à DNA. Reanalisem tudo com serenidade.
Em nome da transparência, liberem para o distinto público o inquérito 2474, onde figuram Daniel Dantas e Rede Globo.
Esqueçam
os holofotes e as diatribes de Merval Pereira. Lembrem que a
Constituição proíbe, expressamente, “juízo ou tribunal de exceção”.
Aceitar
os embargos infringentes não foi mais que uma obrigação constitucional
do STF. O próximo passo dos ministros é fazer o que até hoje não
fizeram: rechaçar definitivamente a pressão espúria, quase chantagem, da
imprensa, reler os autos com isenção, e fazer justiça.