Paulo Henrique Amorim é jornalista de nomeada além de apresentador do programa semanal de variedades da Rede Record aos domingos e editor do site "Conversa Afiada". Vez por outra, PHA - como ele faz referência a si mesmo - dá uma de jornalista dos velhos tempos e sai a campo com entrevistas objetivas e instigantes.
Essa que segue abaixo foi feita com Palmério Dória que está lançando numa forma de continuidade ao "Privataria Tucana" do Amaury Ribeiro Jr. o livro "O Príncipe da Privataria", uma referência desde o título ao autor da maior roubalheira que já se fez neste País que quase foi todo vendido por Fernando Henrique Cardoso - o imortal Barão do Higienópolis.
Vale a pena ler...
PHA: Esse livro tem uma revelação – entre muitas – que é a identidade do ”Senhor X”, o homem que conta tudo sobre a reeleição de Fernando Henrique Cardoso. Palmério, quem é o “Senhor X”?Palmério: O “Senhor X” é uma eminência parda do Acre, isso a gente percebeu logo que o encontrou.
Uma figuraça, elétrica!
Ele é dono de uma retransmissora do SBT; dono de academias de ginástica; prédios e até de um cemitério.
Na campanha da reeleição, ele pegou pela proa a bancada acreana e tirou deles a confissão de que a reeleição estava sendo comprada pelo Serjão Motta (ex-ministro das Comunicações do Governo FHC); Orlei Cameli, então governador do Acre; e pelo Amazonino Mendes (ex-governador do Amazonas).
Isso era só a frente acreana. Na verdade essa compra, pelas contas do Senador Pedro Simon (PMDB-RS), chega a 150 deputados, pelo menos.
PHA: Ele (o ”Senhor X”) se chama Narciso Mendes, não é isso?Palmério: Isso, chama-se Narciso Mendes.
É um potiguar; passou por Belém; casou com uma moça chamada Célia; foi viver no Acre e fez a vida lá.
Foi deputado na Constituinte, depois não se reelegeu, mas a mulher dele se elegeu. Daí ele tinha acesso livre ao Congresso.
Como é um cara muito simpático, despachado, desempenado, ele foi procurado pelo repórter Fernando Rodrigues, da Folha (*), que através de uma intermediação feita pelo Carlos Aírton – outro deputado da época (também do estado do Acre) – Narciso começou a gravar com um gravadorzinho pequenino, que o Fernando Rodrigues tinha, japonês.
Nem precisava perguntar, as pessoas já chegavam contando tudo.
Isso dessa porção acreana da compra de votos.
Agora, o Narciso é também um segredo de polichinelo, né?PHA: Por quê?Palmério: Porque todo mundo sabe que esse homem existe, que é o Narciso Mendes, e ninguém se ocupou, ninguém quis ouvi-lo; chegar lá e dizer: “então, o senhor é o ”Senhor X”, vamos conversar”.PHA: E o Fernando Rodrigues reproduziu as gravações na Folha…Palmério: O Fernando Rodrigues reproduziu, essa matéria teve grande repercussão, o Fernando Rodrigues na época foi capa na revista Caros Amigos. Aliás, a capa foi o próprio gravador que ele usou nas gravações com o ”Senhor X”.
Pena que tenha chegado dez dias depois de a CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) – que naquela época era a CNBB de guerra – denunciar que havia um esquema de compra de votos. Algum tempo depois, veio a matéria (da Folha).PHA: Então, o Narciso Mendes gravou, passou a gravação ao Fernando Rodrigues, que transcrevia a gravação e sempre se referia a ele, Narciso, como ”Senhor X”?Palmério: Sempre se referia a ele como ”Senhor X”, e assim ele apareceu na capa de Caros Amigos.
PHA: Por que o ”Senhor X”, que era um segredo de polichinelo, resolveu sair da toca e se identificar agora ?Palmério: Ele passou por maus bocados de saúde e achou que tinha de contar essa história antes de morrer.
Mas, o fato é que ele está muito longe disso, ele tem saúde para dar e vender e, seguramente, vai viver mais do que eu.
Ele tem um cemitério lá, né? Ele me levou para conhecer o cemitério e eu me candidatei a uma vaga para quando eles implementarem a cremação.
PHA: Você diz que as gravações se referem à compra de votos para a reeleição de Fernando Henrique na bancada do Acre. Quanto se pagava por deputado na bancada do Acre?Palmério: Pagava 200 mil reais. Era um esquema dos tempos dos coronéis, pagava-se em cheque.
Era uma espécie de pré-pago. Depois (de votar) eles trocariam o cheque.
Mas, ai, alguém os advertiu: cheque, né? É como alguém dar um cheque para um traficante – não estou comparando os deputados com os traficantes, mas é por ai.
Ai alguém falou: “é melhor pagar em dinheiro”. Ai passaram a fazer o pagamento em dinheiro, os deputados saiam com sacolas de dinheiro.PHA: E quem é que comprava?Palmério: Nessa operação, no caso do Acre, o Amazonino Mendes, então governador do Amazonas; o Orlei Cameli, do Acre, e outros que eu não sei.
Mas, o Acre é apenas uma ponta, como o Pedro Simon deixa claro.PHA: O seu livro fala que, nas conversas (gravadas) aparecia claramente, como última instância do processo, o Sérgio Motta, ministro das Comunicações do Fernando Henrique.Palmério: Isso. Aparece na época claramente nos jornais. Publicaram o envolvimento dele, as acusações contra ele.
E depois, o Fernando Henrique, sem citar o nome de Narciso Mendes, fala desse episódio no livro ”Arte da Política” – um catatau de umas setecentas páginas, naquele estilo gorduroso de que você fala, né?PHA: Isso, cheio de colesterol…Palmério: Cheio de colesterol!O fato é que é segredo de polichinelo, Paulo, porque todo mundo sabia quem era a peça, quem era a figura, quem fez as gravações. A certa altura do livro, o Fernando Henrique, sem citá-lo, começa a falar dele, começa a desqualificá-lo.
Mas, o fato é que falaram em CPI nessa época, e não houve CPI. A Comissão de Constituição e Justiça ouviu alguns deputados – como você sabe, dois deputados acreanos renunciaram logo em seguida, sobre pressão.
Muito bem, o fato que é que quando se falava em ”Senhor X”, ninguém quis ouvi-lo, nem CPI nem a Comissão de Constituição e Justiça.PHA: Então são 200 mil em dinheiro, para a bancada do Acre. O Pedro Simon calcula que tenham sido comprados 150 deputados. Então é 200 mil, vezes, 150, não é isso? E em dinheiro vivo!Palmério: Em dinheiro vivo! Bufunfa; massaranduba; e em sacolas.
E eu acredito que os comprados do “sul maravilha” não se venderam por 200 mil reais.PHA: Então deve ter sido mais ? Mais de 30 milhões de reais ?Palmério: Eu acho que sim, acho que sim.
O problema do tucanato é o seguinte: eu até te perguntei de quanto deveria ter sido a roubalheira e você não consegue mensurar. Eu acho que nem um computador de última geração desses da NASA consegue mensurar a escala de roubo quando você fala de tucanato.PHA: Agora tem esse negócio de Trensalão.Palmério: É, não dá pra você calcular…PHA: Palmério, o Fernando Henrique já se referiu a esse episódio dizendo que ele e o PSDB não precisavam comprar ninguém, porque a maioria absoluta era a favor da reeleição. No seu livro, o Narciso Mendes contesta esse argumento. Como é que o Narciso contesta isso?Palmério: Ele diz que, por exemplo, o Orlei Cameli não se candidatou à reeleição.
Já começa por ai. No caso acreano, o governador não se candidatou à reeleição. Ele desmonta a tese do Fernando Henrique com esse simples fato.
PHA: Outro argumento do Fernando Henrique é que ele não precisava (buscar a reeleição), mas quem precisava eram os governadores, que estavam tão interessados na reeleição quanto ele. Porque se beneficiariam. Então, pelo mesmo raciocínio do Cameli, você desmonta esse argumento.Palmério: Claro, Claro, sem a menor dúvida.
Então, você vê o esforço que foi feito para ele ( Narciso) não ser ouvido. Como se passam 13 anos e esse cara nunca foi procurado para falar ? Nunca.PHA: Você acredita que o Luís Eduardo Magalhães – você cita ele no seu livro como presidente da Câmara – interveio nesse processo bombardeando a ideia de uma CPI, é isso?Palmério: Sim, sim, foi criado ali um bloqueio total.
Era o bate-bola permanente entre os dois, os dois que faleceram, o Luís Eduardo e o Serjão.
O Serjão era o grande operador, ele e seu projeto de 20 anos (de tucanos no poder).
PHA: Você reproduz no livro uma frase muito interessante do Serjão: “95% das coisas que eu digo foi o Fernando Henrique quem falou; os os outros 5% é o que ele pensa e não diz”.Palmério: Ou seja, é impossível, que o Fernando Henrique não soubesse do que estava rolando nos bastidores.
O desconforto com o qual ele fala disso no livro é a maior bandeira.PHA: O livro “Príncipe da Privataria” é, na verdade, um perfil muito rico, muito detalhado, uma pesquisa minuciosa feita por você e pela sua equipe, e que trata de muitos assuntos.
Trata da Privataria de uma forma geral; trata de outros tipos de financiamento da campanha do Fernando Henrique, como a ligação dele com o então presidente do Banco Bamerindus (Andrade Vieira); trata do processo vil que foi a venda da Vale do Rio Doce.
Tem um episódio muito importante narrado pelo delegado Protógenes Queiroz, que é uma ligação muito mal explicada pelo Fernando Henrique – a relação dele com títulos da dívida externa brasileira em posse do banco francês Paribas.Palmério: De quando ele era ministro da Fazenda e o Armínio Fraga era o homem do Banco Central.PHA: Tem um componente importante desse seu livro que é a cumplicidade da imprensa brasileira no episódio do filho que o Fernando Henrique Cardoso pensou por muito tempo ter tido com uma jornalista da TV Globo.
Qual é a relação desse episódio com a TV Globo? Como que a Globo participa desse processo de acobertar um fato público, que é o presidente da República ter um filho, ou supor ter um filho, com uma jornalista de vídeo, da emissora de televisão mais vista do país.
Onde se casam – sem trocadilhos – Fernando Henrique Cardoso e a Globo nesse caso do filho que ele reconheceu e que, na verdade, não era dele.Palmério: É o Proer da imprensa, eis aí uma tese de doutorado, Paulo Henrique. A figura central da TV Globo nesse caso é o Alberico Souza Cruz – que tomou o lugar do Armando Nogueira depois que manipulou aquele debate Lula x Collor.
Então, ele passou a circular com desenvoltura por Brasília.
Ele era amigo da Míriam Dutra (jornalista que teve o suposto filho de FHC) – ela era subordinada dele, né? – e era muito amiga da Rita Camata (ex-deputada federal), que, por coincidência, começou a aparecer em todos os espaços (da Globo), especialmente no Jornal Nacional.
Ele (Alberico) era um dos bombeiros. O outro era o José Serra, o planejador; e o Serjão, o operador.
Foram eles que operaram a transferência da Míriam para SIC, (Sociedade Independente de Comunicação), em Portugal (associada à Globo).
Não à toa: o Alberico é padrinho do Tomás (suposto filho de FHC).PHA: Então, o Alberico remove a Míriam para Lisboa e apadrinha o menino?Palmério: Apadrinha o menino, depois ela é transferido para Barcelona.
Agora, como houve o Proer dos bancos houve um Proer da imprensa.
Um dinheiro oficial, e até mesmo privado, em uma quantidade imensa, incalculável, para comprar o silêncio da mídia sobre o filho de Míriam Dutra, o “bolsa pimpolho”, como muitos denominaram.
Eu acho que todos os veículos de comunicação investigaram o caso, mas não publicaram. Alegaram que era para ter e usar apenas se o concorrente furasse; matéria de gaveta, como se diz.
Isso lembra um arsenal dissuasório, como se diz: ”olha, há bombas nucleares suficientes para destruir o planeta ‘N’ vezes, mas não é para usar, é para ter”. Então a chantagem campeia pela imprensa, né?PHA: Na verdade, o que eu chamo de PIG, aqui, no nosso site, não chegou a usar essa bomba.Palmério: Não, não usou. E depois na matéria da Caros Amigos nós ouvimos, um a um, os diretores de redação de jornais e revistas da época.PHA: E isso está no livro também. Palmério, só para concluir: depois de muito tempo, ficou confirmado que o filho que o Fernando Henrique supunha ter não era dele, era de outra pessoa.
E tem no livro – e é evidentemente que não podemos revelar aqui – uma cena de comédia italiana, que é o diálogo de Fernando Henrique e Míriam Dutra depois que ficou comprovado que o filho não era dele.Palmério: É, um amigo meu disse que deu uma estrondosa gargalhada com o fim do livro.
Agora eu só queria dizer uma coisa para você, Paulo Henrique, esse é um bom livro para ler na Semana da Pátria, não é?PHA: Aliás, o 7 de Setembro que Fernando Henrique qualificou como uma palhaçada.Palmério: Exatamente, Exatamente…PHA: Parabéns, Palmério, depois de desmontar o pessoal do ”Honoráveis Bandidos”, do José Sarney – quantos livros já vendeu o José Sarney?Palmério: O Zé Sarney já vendeu cerca de 130 mil livros. Mas, a turma do Zé Sarney, perto dessa turma do Fernando Henrique, não passa de amadores. É outra escala.PHA: Os ”Honoráveis Bandidos” são amadores…Palmério: É, é outra escala, outra escala…
***
A propósito aí está um bom convite:
Quem puder ir não vai perder viagem...