No site da Agência Carta Maior, Eric Nepomuceno escreve:
Coisas estranhas no Brasil
Existe um inegável mal-estar generalizado, palpável no ar. Há
um crescente pessimismo com a economia. E aí começam a aparecer
estranhezas.
Eric Nepomuceno
As eleições acontecerão em
outubro, a campanha oficial começa no rádio e na televisão em agosto,
mas as pesquisas saltitam a cada quinzena, ou quase. Se o eleitorado
parece desinteressado, o empresariado parece, mais que interessado,
ansioso, inquieto.
As pesquisas mais recentes, do Datafolha,
indicam que Dilma Rousseff retomou seu viés de queda. Isso, claro, é
destacado no noticiário. O que ninguém parece lembrar é que seus dois
principais adversários, o tucano Aécio Neves e Eduardo Campos, do PSB,
também caíram.
Dilma havia recuperado terreno em pesquisas
anteriores, e agora tornou a cair. Uma questão nebulosa: se ela
retrocede e os outros não avançam – pior: também recuam –, onde foram
parar os votos perdidos? Por que nenhum dos dois netos, cujos avôs são a
principal garantia de suas trajetórias, é beneficiado?
Tudo
indica que a maior surpresa foi o forte aumento dos que declaram que seu
voto será nulo ou em branco, e também dos que se declaram indecisos.
Nesses quesitos, houve uma reviravolta em comparação às pesquisas
anteriores.
Existe um inegável mal-estar generalizado, palpável
no ar. Há um crescente pessimismo com a economia. E aí começam a
aparecer estranhezas.
Por exemplo: muito se martela a nota de que
vivemos debaixo de forte pressão inflacionária. Essa campanha persiste e
se alastra, apesar de os índices mostrarem o contrário (desde meados de
março a taxa de inflação vem baixando de maneira constante). Ao mesmo
tempo, fala-se que aumentou o temor a perder o emprego, apesar dos
índices de desemprego continuar baixos.
Há contradições e
incongruências entre os próprios entrevistados, tanto nos resultados do
Ibope como nos do Datafolha: a aprovação do governo de Dilma equivale à
desaprovação. A imensa maioria (na média dos institutos, mais de 70% dos
entrevistados) pede mudanças na forma de governar, mas um índice
similar diz que sua vida melhorou e que estão satisfeitos. Há uma
espécie de batalhão desnorteado, que se queixa de tudo e de qualquer
coisa sem dizer exatamente de que se trata. De onde vem esse mal-estar,
essa tensa irritação que impregna a atmosfera das grandes cidades
brasileiras?
Não são poucos – nem necessariamente paranoicos – os
brasileiros que sentem que, a cada semana, aumenta a sensação de que
está em marcha um nebuloso, melífluo movimento desestabilizador. O que
ninguém consegue é detectar quem está por trás, quem organiza, a que
interesses esse movimento responde.
E no entanto, existe um dado
que, se não dá resposta a essas questões, certamente dá o que pensar: a
influência direta entre a divulgação dos resultados das pesquisas e as
oscilações do mercado financeiro, que tem nos grandes meios de
comunicação seu esforçado e eficaz porta-voz.
Desde 2002, quando
Lula derrotou José Serra, essa sacrossanta entidade chamada mercado não
padecia tamanhos ataques de ansiedade pré-eleitoral. A reeleição de
Lula, em 2006, e a eleição de Dilma, em 2010, foram engolidas sem
maiores esforços. Agora, o clima é outro, bem outro.
Não é sem
razão que bancos, agentes, corretores e investidores gastam um bom
dinheiro contratando pesquisas eleitorais para uso restrito. São
pesquisas paralelas, e o sistema funciona assim: cada vez que um
instituto anuncia que estará em campo fazendo entrevistas, instituições
financeiras encomendam outra, sigilosa. Desta forma ficam sabendo, com
um ou dois ou três dias de antecipação, qual será o resultado a ser
anunciado. Como a cada queda (ou avanço) de Dilma ocorre invariavelmente
uma alteração na Bolsa de Valores, uma oscilação no câmbio e outra na
taxa de juros a futuro, ter uma indicação fiável desses dados
significa uma boa oportunidade de especular e ganhar.
O
empresariado brasileiro não gosta nem um pouco da política econômica de
Dilma Rousseff. Os donos do dinheiro, menos ainda. Mas gostam de ganhar.
E adoram especular.
Há algo estranho quando tantas greves se
repetem e persistem, e mais ainda quando levadas adiante por minorias
sindicais, como aconteceu no transporte público do Rio de Janeiro. A
profusão de paralizações não faz mais do que ampliar o mal-estar e a
irritação popular. Nota-se claramente que, insuflada pelos grandes meios
de comunicação, em especial a televisão, essa irritação popular é
direcionada aos políticos em geral e aos governos em particular. E, uma
vez mais, Dilma é o alvo preferencial.
Nesse clima estranho,
nessa atmosfera um tanto rarefeita, começa a Copa do Mundo. Haverá
mobilizações de protesto, greves selvagens e sem norte, haverá de tudo
um pouco, até mesmo futebol.
Serão tempos estranhos, e estranha será a caminhada daqui até as urnas de outubro.