Depois que um político líder de uma Central Sindical, visivelmente bêbado, desfiou insultos à Presidente da República, na presença omissa de um candidato ao cargo desrespeitado que nada fez e também parecia pouco sóbrio, o sindicalismo entra na pauta de um dos ícones do jornalismo brasileiro, Alberto Dines, com esta matéria no "Observatório da Imprensa":
Do peleguismo à delinquência

Por Alberto Dines
O Brasil ofereceu na terça-feira (20/5), em São Paulo, importante
contribuição para o descrédito do sindicalismo como instrumento de
defesa dos direitos dos trabalhadores, quando uma facção da agremiação
que reúne motoristas e cobradores de ônibus urbanos, numa operação de
guerrilha, organizou uma greve-surpresa, trancou o trânsito na hora do
rush e durante os dois dias seguintes estabeleceu o caos na maior
metrópole do país.
A operação comprometeu seriamente a imagem de um sindicato (cujo
histórico não é dos mais decentes) e que, na véspera, fechara um acordo
com o patronato. Afetou drasticamente a vida de um milhão de
trabalhadores de outros sindicatos impedidos de cumprir suas obrigações e
prejudicou a sociedade ao descumprir a lei que determina que nas
paralisações no serviço público seja garantido um funcionamento mínimo à
população.
Mais grave: confirmou as suspeitas de infiltração da grande
delinquência nas manifestações promovidas pelos movimentos sociais. Os
agitadores retiraram as chaves dos ônibus nas garagens impedindo sua
utilização, abandonaram alguns com pneus furados em importantes
cruzamentos no perímetro central e depredaram mais de cem coletivos.
As autoridades atônitas denunciam a sabotagem, mas na véspera de um
evento mundial com as dimensões da Copa do Mundo acautelam-se e procuram
evitar um aumento das tensões com a entrada em cena das grandes
centrais ávidas para incrementar a sua influência política. As polícias,
por sua vez, mantêm a tática de minimizar a infiltração das facções
criminosas imaginando com esse faz-de-conta que podem ocultar da
população o poder crescente do crime organizado na vida nacional.
Indícios preocupantes
O sindicalismo moderno tem as suas origens na Revolução Industrial, no
final do século 18, e suas primeiras ações dirigiram-se contra as
máquinas que ofereciam aos patrões a oportunidade de diminuir postos de
trabalho e impor baixa remuneração. Marx e Engels lembraram em meados do
século 19 que o proletariado deveria unir-se para obter melhores
condições: o inimigo não era a máquina, mas aqueles que as empregavam
para fomentar a desunião.
Nos anos 20 e 30 do século passado, o fascista Benito Mussolini adotou a
“Carta del Lavoro” que serviu de inspiração a inúmeros governos
autoritários, inclusive o Estado Novo implantado por Getúlio Vargas em
1937. Os sindicatos mudaram meta e táticas: o objetivo passou a ser o
fortalecimento do Estado e não a melhoria das condições de vida e
trabalho. O sindicalismo chapa-branca, estimulado por Vargas e apelidado
de “pelego” (a pesada manta colocada entre os arreios e a pele dos
cavalos para amenizar os efeitos do trote), foi igualmente utilizado na
ditadura militar para oferecer uma base de apoio popular a um governo
discricionário.
Quem liquidou o peleguismo foi o líder Luiz Inácio Lula da Silva a
partir das greves no ABC, em São Paulo, nos fins dos anos 1970, com o
saneamento dos sindicatos, especialmente os de metalúrgicos,
reconduzidos ao caminho original de lutar por melhores condições sociais
e políticas.
Três décadas depois, é preciso que os seguidores de Lula não permitam a
substituição dos pelegos por malfeitores. Há indícios de que alguns
militantes estão deixando os escrúpulos de lado para obter apoios em
esferas próximas ao crime organizado. A proximidade das eleições
justificaria a jogada. É insanidade.