Sobre o mais novo queridinho da "Óia" depois do Carlinhos Cachoeira, Demósthenes Torres e companhia...
O Estado de S. Paulo - Editorial
Promiscuidade que condena
09 de maio de 2010 | 0h 00
- O Estado de S.Paulo
Quem ocupa o cargo de secretário nacional de Justiça, no
exercício do qual comanda áreas estratégicas do Estado - como a de
rastreamento de dinheiro ilegal no exterior e o controle da regularidade
da situação de estrangeiros no País -, e, além do mais, é presidente do
Conselho Nacional de Combate à Pirataria não pode ter relações tão
estreitas com um cidadão preso há vários meses sob a acusação de
comandar uma quadrilha especializada em contrabando de telefones
celulares, como tem o delegado Romeu Tuma Júnior com Li Kwok Kwen,
conhecido como Paulo Li.
Se, por razões de amizade ou de qualquer outra
natureza, tiver esse tipo de relação, não pode ocupar os cargos públicos
que ocupa no governo federal.
Não se trata de condenar antecipadamente o secretário nacional de
Justiça sem que lhe tenha sido dado o direito de explicar suas relações
com Paulo Li. Ele tem todo o direito de se justificar e as autoridades
policiais têm o dever de investigar esse caso em profundidade, para que
não restem dúvidas ou suspeitas. Trata-se de começar, de uma vez por
todas, a combater com eficácia a cultura da promiscuidade que prevalece
no País, sobretudo no setor público - e, de maneira notável, na área
federal.
Já para o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), não há nada de
condenável na relação de amizade entre o secretário nacional de Justiça
e o indigitado Paulo Li. Na opinião do senador do Maranhão (Estado onde
efetivamente exerce seu poder político, embora tenha sido eleito pelo
Amapá), não têm substância as investigações da Polícia Federal (PF)
ligando o delegado a uma pessoa acusada de chefiar "uma das maiores
organizações criminosas de São Paulo e, consequentemente, do País". O
que há, segundo o senador, são apenas informações sobre a compra de um
telefone (por Tuma Júnior, de Paulo Li) e um pedido de emprego para o
"genro".
Não haveria nada de mais, de fato, se a compra fosse de um objeto
importado regularmente, fornecido por comerciante legalmente
estabelecido, e o pedido de emprego não envolvesse pressões sobre
funcionários públicos por meio do uso do prestígio do cargo que ocupa.
Mas não é disso que se trata. Como mostrou reportagem de Rodrigo
Rangel publicada pelo Estado quarta-feira, gravações telefônicas e
mensagens eletrônicas interceptadas pela PF durante investigação sobre
contrabando revelam muito mais.
Ao ser preso, no ano passado, com mais 13 pessoas acusadas de chefiar
a quadrilha que contrabandeava celulares da China - os aparelhos
recebiam placas com marcas de produtos conhecidos no mercado e eram
vendidos no comércio paralelo de São Paulo e do Nordeste -, Li telefonou
para Tuma Júnior na frente dos agentes federais. Ele fazia isso com
frequência. As gravações mostram que o secretário nacional de Justiça
encomendava a Li telefones celulares, computador e aparelhos de
videogame.
Paulo Li, de sua parte, tinha livre trânsito na Secretaria Nacional
de Justiça e se apresentava como "assessor especial" do órgão. Segundo a
PF, Li também ganhava dinheiro fazendo andar mais depressa os processos
de emissão de vistos permanentes de chineses em situação irregular no
País. Esses vistos são emitidos pelo Departamento de Estrangeiros,
subordinado ao secretário nacional de Justiça.
Em outras gravações, a PF descobriu que Tuma Júnior tentou pressionar
as autoridades policiais de São Paulo - ele é delegado estadual - para
conseguir aprovar o namorado da filha em concurso para escrivão de
polícia. O secretário nacional de Justiça não teve êxito na pressão,
pois o namorado de sua filha foi reprovado.
Não são relações e atitudes simples e fáceis de justificar - e até o
momento o delegado Tuma Júnior não apresentou justificativas
convincentes. Mas, mesmo que as apresente e comprove que nada tem a ver
com as ilegalidades praticadas pelo amigo e que não utilizou o prestígio
do cargo que ocupa para beneficiar parentes ou contraparentes, as
informações já conhecidas sobre o caso recomendam seu afastamento
imediato do cargo - para o qual foi nomeado por razões meramente
políticas.