O site "Jus Navigandi" é especializado em problemas e notícias do judiciário. Apartidário, sua opinião agora ganha um novo sentido e ele se pergunta:
Fábio de Oliveira Ribeiro
Do Jus Navigandi
Em algumas oportunidades, a justiça é feita pelo Judiciário. Em outras, apenas povo está em condições de fazê-la. Foi o que ocorreu neste caso em que o STF/mídia condenou os petistas, mas o povo absolveu e até premiou o PT.
Em algumas oportunidades, a justiça é feita pelo Judiciário. Em outras, apenas povo está em condições de fazê-la. Foi o que ocorreu neste caso em que o STF/mídia condenou os petistas, mas o povo absolveu e até premiou o PT.
O julgamento do Mensalão acabou e os
réus condenados foram presos. Agora já podemos discutir quem ganhou e
quem perdeu durante e este julgamento.
Sob o ponto de vista
político-partidário, a oposição foi a maior perdedora durante o
processo. O julgamento do mesmo foi realizado durante eleições, exibido à
exaustão pela imprensa e utilizado pelo PSDB e DEM como sua principal
arma de propaganda contra o PT. Mesmo assim, o PT manteve a presidência e
cresceu enquanto o PSDB e DEM encolheram a olhos vistos.
A imprensa exulta, pois conseguiu
pautar o STF e conduzir o julgamento até ele desaguar no resultado que
desejava. Mesmo assim (ou exatamente por causa disto), a reputação do PT
cresceu no seio da população. Afastando-se dos anseios populares, a
mídia cavou sua própria cova. Quando tiver que lutar contra a Lei de
Meios não terá qualquer apoio popular em virtude de ter exigido o
sacrifício jurídico-ritual de dois importantes líderes petistas que
ajudaram a construir um Brasil melhor (José Dirceu e José Genoino).
Joaquim Barbosa ganhou intensa
publicidade gratuita na mídia durante o julgamento. Ele foi até capa de
revista na Veja (O menino pobre que mudou o Brasil). Mas depois disto,
teve sacadas contra si graves denúncias de desmandos (recebimento de
salários sem dar aula, compra de apartamento nos EUA mediante operação
financeira ilegal, uso de passagens pagas pelo STF para fins pessoais,
etc...). Se tivéssemos senadores à altura dos cargos que ocupam, o
Presidente do STF teria sofrido um processo de Impedimento.
Em razão de suas posições moderadas,
Ricardo Lewandowski foi execrado pela mídia durante o julgamento. A
campanha contra ele atingiu seu ponto máximo quando aquele Ministro
proferiu seu voto dizendo com todas palavras quem foram os verdadeiros
beneficiários do esquema de corrupção denominado Mensalão: Rede Globo,
Folha de São Paulo, Estado de São Paulo e Abril Cultural (editora da
Veja), empresas de comunicação que lucraram milhões de reais para fazer
publicidade político-partidária. Mesmo tendo sido derrotado e perseguido
pela mídia, Lewandowski saiu do julgamento fortalecido. Quando se
tornar Presidente do STF e tiver a oportunidade de apreciar um pedido de
liminar em ADIN movida contra uma Lei de Meios considerada danosa aos
interesses dos barões da mídia ele terá oportunidade de ser coerente.
Esperamos que ele trate com o devido rigor a corja de canalhas que
controla a mídia e que se beneficiou do esquema do Mensalão sem
sentar-se no banco dos réus.
O STF foi o grande perdedor desta
história. Primeiro porque julgou o Mensalão do PT (mais recente) antes
do Mensalão Tucano (mais antigo), dando a entender que a Justiça
brasileira não trata de maneira igual os desiguais. O tratamento
desigual dispensado aos desiguais seguirá sendo uma nódoa na história do
STF, especialmente se o Tribunal deixar prescrever o Mensalão Tucano
(hipótese que se torna mais provável a cada dia que passa). Além disto, a
mesma imprensa que silenciou sobre o caráter seletivo do STF durante o
julgamento do Mensalão do PT, certamente fará intensa propaganda contra a
cúpula do Judiciário quando ela resolver tratar Eduardo Azeredo como se
ele fosse José Genuíno. Num futuro próximo, o STF pode se tornar tão
impopular na elite quando se tornou execrado nos meios populares. As
consequencias disto certamente não serão benéficas para a instituição.
Em segundo lugar, o STF também
sagrou-se perdedor durante este julgamento por causa dos cochilos de
Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes diante das câmeras. A autoridade da
atividade judiciária depende bastante da respeitabilidade do julgador.
Ninguém respeita um Tribunal cujos membros dormem em serviço. As cenas
grotescas dos bate-bocas iniciados por Joaquim Barbosa, o tratamento
indigno que ele dispensou aos seus colegas (especialmente Ricardo
Lewandowski) também macularam bastante o STF e o relator do processo.
Afinal, só os tiranos julgam com raiva esquecendo-se da razão e da
necessidade de convencer com educação.
O protagonismo midiático do STF
certamente comprometeu o resultado do julgamento. Durante todo o
processo alguns Ministros demonstraram que estavam dispostos a reagir à
exposição na mídia de maneira absolutamente simétrica à reação que a
mesma tinha acerca das posições que eles adotavam. Isto provocou uma
confusão entre os campos jurídico e midiático, ao ponto de vermos alguns
Ministros se comportarem no STF como se fossem atores/telejornalistas
enquanto alguns jornalistas passaram a julgar o caso nas páginas dos
jornais e revistas como se fossem Juízes. Esta confusão conseguiu
produzir um grande espetáculo, mas empobreceu a qualidade da decisão que
foi proferida. Afinal, a imprensa é privada e visa lucro e o STF é um
órgão público encarregado de distribuir a melhor justiça possível de
acordo com a legislação vigente (algo que não ocorre quando a isenção do
Juiz é comprometida em razão de sua paixão pela notoriedade).
Por fim, ao condenar os réus do
Mensalão com base em ilações jurídicas distorcidas e usando como provas
as matérias jornalísticas produzidas e divulgadas à exaustão pelos seus
inimigos políticos (Joaquim Barbosa), porque a literatura assim o
permite (Rosa Weber) e em virtude deles não terem conseguido provar sua
inocência perante o Tribunal (Luiz Fux) a maioria dos Ministros do STF
agiu de maneira brutal. No futuro, serão inevitáveis as comparações
históricas entre o julgamento do Mensalão do PT e a condenação de Tomás
Antonio Gonzaga e/ou a repressão judiciária contra os participantes da
Revolta dos Quebra-Quilos (episódios que mancharam respectivamente a
Justiça Colonial e o Judiciário Imperial) . A violência constitucional
praticada no caso do Mensalão do PT é inaceitável e custará caro à
imagem do STF dentro e fora do país no futuro.
O povo viu e ouviu o julgamento
durante as eleições presidenciais, mas votou de maneira diferente da
desejada pela mídia. A imprensa usou o Mensalão do PT acreditando que
conseguiria produzir uma vitória do PSDB e DEM. Mas a esmagadora maioria
dos brasileiros elegeu Dilma Rousseff provendo-a de uma bancada
parlamentar suficientemente grande e forte. Desde então, a imprensa
perdeu todos os embates que teve com o governo no Congresso Nacional.
Nada indica que isto venha a se modificar num futuro próximo, pois
nenhum dos candidatos presidenciais apresentados pela mídia consegue
conquistar os corações e mentes dos brasileiros. Durante todo o
julgamento o povo agiu com sobriedade, formando seu convencimento na
urna à revelia da mídia e do espetáculo grotesco fornecido à mesma pelo
STF. Esta prova de maturidade política sugere que o grande ganhador do
julgamento foi o povo e não a oposição, a mídia ou o Judiciário.