Viaje mais, presidente!
Opinião: por Marcelo Odebrecht
Da Folha de S. Paulo
O tratamento dado por muitos às viagens de Lula reforça a
desconfiança. Quero minhas filhas orgulhosas do que temos feito mundo
afora
Minha tendência natural perante assuntos que despertam polêmicas,
como as reportagens e os artigos publicados nas últimas semanas sobre
viagens do ex-presidente Lula, é esperar a poeira baixar.Dessa vez, resolvi agir de modo diferente porque entendo que está em jogo o interesse do Brasil e o legado que queremos deixar para as futuras gerações.
As matérias, em sua maioria em tom de denúncia, procuraram associar as viagens a propósitos escusos de empresas brasileiras que as patrocinaram, dentre elas a Odebrecht.
A Odebrecht foi, sim, uma das patrocinadoras da ida do ex-presidente Lula a alguns dos países citados. E o fizemos de modo transparente, por interesse legítimo e por reconhecer nele uma liderança incontestável, capaz de influenciar a favor do Brasil e, consequentemente, das empresas brasileiras onde quer que estejam.
O ex-presidente Lula tem feito o que presidentes e ex-presidentes dos grandes países do hemisfério Norte fazem, com naturalidade, quando apoiam suas empresas nacionais na busca de maior participação no comércio internacional. Ou não seria papel de nossos governantes vender minérios, bens e serviços que gerem riquezas para o país?
Nos últimos meses, o Brasil recebeu visitas de reis, presidentes e ministros, e todos trouxeram em suas comitivas empresários aos quais deram apoio na busca de negócios.
Ocorre que lá fora essas ações são tidas como corretas e até necessárias. Trazem ganhos econômicos legítimos para as empresas e seus países de origem e servem para a implementação da geopolítica de governos que têm visão de futuro, como o da China, por exemplo, que através de suas empresas, procuram, cada vez mais, ocupar espaços estratégicos além fronteiras.
Infelizmente, aqui o questionamento existe, talvez por desinformação. Permitam-me citar alguns números. A receita da Odebrecht com exportação e operações em outros países, no ano de 2012, foi de US$ 9,5 bilhões e nossa carteira de contratos de engenharia e construção no exterior soma US$ 22 bilhões.
Para atender a esses compromissos, mobilizamos 2.891 empresas brasileiras fornecedoras de bens e serviços. No conjunto, elas exportaram cerca de 60 mil itens. Dessas, 1.955 são pequenas empresas e, no total, geraram 286 mil empregos em nosso país. É uma enorme cadeia de empresas e pessoas que se beneficia de nossa atuação em outros países e, obviamente, se beneficia também do apoio governamental a essa atuação.
Esse apoio se dá, dentre outras formas, com os financiamentos do BNDES para exportação que, no caso da Odebrecht, é bom que se frise, representam 18% da receita fora do Brasil.
Estamos em 22 países, na grande maioria deles há mais de 20 anos, e exportamos para outros 70. Como ex-presidente, Lula visitou sete, e esperamos que ele e outros governantes visitem muitos mais.
Esses números falam por si, mas decidi me manifestar também porque não quero que disso fiquem sentimentos de covardia ou culpa para as pessoas que trabalham em nossa organização.
Quero minhas filhas e os familiares de nossos integrantes de cabeça erguida, orgulhosos do que nós e outras empresas brasileiras temos feito mundo afora, construindo a Marca Brasil para além do samba e do futebol, ao mesmo tempo em que contribuímos para a prosperidade econômica e justiça social nos países e comunidades onde atuamos.
A inserção internacional nos tornou um país socialmente mais evoluído e comercialmente mais competitivo porque gerou divisas, criou empregos, permitiu trazer novas tecnologias e estimulou a inovação.
O tratamento que está sendo dado por muitos às viagens do ex-presidente Lula é míope e reforça entre nós uma cultura de desconfiança.
Caminhar na construção de uma sociedade de confiança, fundada no respeito entre empresas, entre estas e o poder público e entre o poder público e a sociedade será muito bom para todos nós.