Velha mídia esconde discurso de Temer sobre razões políticas do impeachment
Jornal GGN - Na quinta (22), o presidente Michel Temer foi alvo de uma reportagem no The Intercept Brasil por ter dito, num discurso para investidores estrangeiros em Nova York, que Dilma Rousseff sofreu um impeachment por razões políticas: não aceitou o programa neoliberal criado pelo PMDB, chamado de "ponte para o futuro". Hoje, nenhum dos jornais da velha mídia oligarquica tratou do assunto. A única exceção foi uma colunista do Estadão que, pelas redes sociais, tentou desmoralizar o The Intercept e defender Temer.
Por Glenn Greenwald
No The Intercept
Ontem, Inacio Vieira do The Intercept Brasil expôs uma das mais
significativas provas das verdadeiras motivações por trás do impeachment
da presidente eleita, Dilma Rousseff. Em palestra para um grupo de
empresários e dirigentes da política externa americana, o atual
presidente, Michel Temer, admitiu que não foram as pedaladas fiscais que
deram início ao processo de impeachment, mas a oposição de Dilma à
plataforma neoliberal, composta de cortes em programas sociais e
privatizações, proposta pelo PMDB.
Mas o que é ainda mais revelador do que o casual reconhecimento das
motivações golpistas de Temer é como a grande mídia brasileira — unida
em torno do impeachment — ignorou completamente o comentário do
presidente. Literalmente, nenhum dos inúmeros veículos do Grupo Globo,
nem o maior jornal do país, Folha, e nenhuma das revistas políticas
sequer mencionou os comentários surpreendentes e incriminadores de
Temer. Foi imposto um verdadeiro apagão. Enquanto diversos jornalistas e
sites independentes abordaram a admissão do recém-empossado, nenhum dos
grandes veículos de comunicação disse uma só palavra.
A única exceção à cortina de silêncio que se fechou foi a colunista
do Estadão, Lúcia Guimarães, que investiu horas no Twitter
humilhando-se, num enorme esforço em negar que Temer havia dito o que
disse. Começou por insinuar que o The Intercept Brasil teria feito um
“corte” suspeito no vídeo que alterava sua genuinidade — basicamente
acusando Inacio Vieira de cometer uma fraude — sem apresentar nenhuma
prova quanto a isso. Tudo em função de proteger Temer.
Após um colunista da Folha enviar um link para o vídeo completo,
Lúcia escreveu que só poderia acreditar que Temer havia feito a
afirmação quando visse os drives originais das câmeras exibidos
simultaneamente. Ela acrescentou que o que torna suspeita a reportagem é
o fato de Temer ser um autor de um best-seller de direito
constitucional, que não diria um “despautério” desses.
Apenas quando a transcrição oficial completa do Palácio do Planalto
foi publicada, a colunista finalmente admitiu que Temer havia dito a tal
frase, mas, em vez de retratar as acusações falsas ou se desculpar com
Inacio Vieira e com o The Intercept Brasil por ter sugerido que o vídeo
teria sido fraudado, ela apenas publicou a parte relevante do discurso
de Temer, como se ela mesma tivesse descoberto a citação e estivesse
informando seus seguidores. Mesmo após admiti-lo, a jornalista alegou de
forma ligeiramente amargurada que os oponentes do impeachment estavam
transformando a questão em um carnaval e comemorando a revelação.
Mesmo tento sido forçada a fazê-lo por ter se complicado para
defender Temer, ao menos uma colunista do Estadão reconheceu a
existência de uma reportagem de tamanha importância. O resto da grande
mídia brasileira a ignorou por completo. Imagine a seguinte situação: o
recém-empossado presidente de um país admite para uma sala repleta de
oligarcas e imperialistas que ele e seu partido deram início ao processo
de impeachment da presidente eleita por razões políticas e ideológicas,
e não pelos motivos previamente alegados. Toda a grande imprensa
brasileira finge que nada aconteceu, se recusa a informar os brasileiros
sobre a admissão do presidente e ignora as possíveis repercussões sobre
o caso do impeachment.

Há um motivo para a organização Repórteres Sem Fronteiras ter
reduzido a posição do Brasil em seu ranking de liberdade de imprensa
para 104 e denunciado a grande mídia corporativa como uma ameaça para a
democracia e liberdade de imprensa no país. Como explicou a ativista
brasileira Milly Lacombe: “Temer confessa o golpe, existe uma gravação
com a confissão e nossa mídia corporativa esconde o que ele disse. Tá
bom ou precisa de mais?” Um dos mais palpáveis exemplos foi dado através
deste lamentável silêncio.